Aniversário icônico

Cine Theatro Brasil Vallourec, como é chamado o primeiro prédio de Belo Horizonte com influência Art Déco, completa 90 anos

Insta: CINE THEATRO BRASIL VALLOUREC

Na Belo Horizonte dos anos 30, o crescimento econômico provocou uma mudança na ocupação do centro da cidade: a área até então destinada a residências passou a receber prédios comerciais. Com o aumento da densidade populacional, a jovem capital projetada por Aarão Reis se viu também diante do fenômeno da verticalização, e cada vez mais, os grandes edifícios passaram a fazer parte da paisagem. É nesse cenário de efervescência urbana e cultural – com a vida noturna agitada dos cassinos, teatro de revista, bailes e salas de cinema – que surge o Cine Theatro Brasil, em 14 de julho de 1932.

O primeiro prédio da cidade sob a influência do estilo Art Déco, projetado por Alberto Murgel, é ainda uma referência para a arquitetura urbana moderna e um marco para a capital mineira. Inspirado na tradição francesa que apostava em volumes geométricos bem definidos, pouca ornamentação e vitrais de ferro e vidro martelado, a construção também rompeu barreiras ao utilizar concreto armado, importado da Inglaterra.

O estilo arquitetônico do Cine Theatro Brasil abriu caminho para novas construções das décadas seguintes, incluindo as sedes da Prefeitura Municipal e dos Correios. Pioneiro, o Cine desempenhou ainda papel fundamental, tornando BH uma das cidades brasileiras de referência no estilo Art Déco. Essa marca está presente, inclusive, no desenho dos lustres do Cine, embora tenham sido substituídos por reproduções das peças originais.

Inaugurado como o maior cinema do país, as telas do Cine Brasil receberam os principais filmes que marcaram a fase áurea da produção cinematográfica. Após as sessões de estreia do filme Deliciosa (romance musical estrelado por Janet Gaynor e Raul Roulien), que reuniram cinco mil pessoas, a programação variada do Cine exibiu ainda produções como E o Vento Levou (exibido em novembro de 1940, por dez dias consecutivos), o desenho Branca de Neve, e Aviso aos Navegantes, filme carnavalesco da Atlântida com Oscarito e Grande Otelo.

Durante alguns anos, o Cine Theatro Brasil foi também o prédio mais alto da capital. Com seus oito andares, atraiu turistas e moradores que pagavam ingresso para visitar o terraço e admirar a Serra do Curral. O Cine Theatro Brasil foi ainda ponto de encontro da sociedade belo-horizontina e recebia os tradicionais bailes de carnaval que aconteciam nos foyers. Além do antigo teatro com 1.827 lugares, por muitas décadas o prédio abrigou salas comerciais e espaços tradicionais como o Bar Brasil e o primeiro Restaurante Popular de Minas Gerais, inaugurado por Juscelino Kubitschek em 1952.

Com o surgimento dos shoppings centers e dos novos hábitos de lazer e consumo, as salas de rua começaram a entrar em declínio em todo o Brasil e, em 1999, o Cine Brasil encerrou suas atividades com a exibição de “O Especialista”, de Sylvester Stalone.

Em 2006, a Fundação Sidertube adquiriu o prédio e iniciou o processo de restauração, com o intuito de transformá-lo em um novo centro de cultura para a população da capital. Após sete anos de trabalho, em 2013 o Cine Theatro Brasil Vallourec foi reinaugurado e reaberto com uma das exposições de maior sucesso na capital mineira: Guerra e Paz, de Cândido Portinari.

Algumas curiosidades marcam ainda mais a história da construção. Muito tradicional em construções antigas, a pedra marca fundamental é colocada onde se dá início às obras. No caso do Cine Theatro Brasil, a pedra foi colocada em 1930, já que a construção do prédio durou dois anos. Junto com ela, foi colocada uma cápsula do tempo. A caixinha existe até hoje, com fotos em jornais da época e foi encontrada na restauração do Cine, em 2006, no Teatro de Câmara.

Outra curiosidade é que o prédio, que inicialmente foi usado como cinema, tinha também outras atrações, como a exibição na tela de jogos de futebol, concursos musicais e programas de TV. No final dos anos 1960, por exemplo abrigou um programa semanal, o Brasa 4, da TV Itacolomi. Por lá também existiu um efervescente centro comercial. Quando foi inaugurado, 70% das lojas já estavam locadas para as mais diversas atividades como aula de violão, contador e consultórios de dentistas. As lojas ficavam no quinto, sexto e algumas no sétimo andar.

O Cine passou por muitas reformas ao longo dos anos. Uma das mais radicais 1985, retirou os vitrais da fachada e teve os vãos preenchidos de argamassa. Anteriormente, em 1960, eles já haviam sido cobertos por um gigante anuncio publicitário, que dificultava a leitura da fachada.

O prédio teve três tentativas de tombamento negadas. Uma delas na década de 1980, quando o prédio do Cine estava para ser vendido para um banco. O IEPHA-MG se adiantou e elaborou um dossiê de tombamento, mas o documento não foi homologado pelo governo do Estado. O tombamento pelo município e pelo estado só aconteceu em 1999.

Um de seus espaços, o Teatro de Câmara, prevalece com as cadeiras originais e conta com 250 lugares.  Os assentos originais eram verdes, mas foram trocados e ganharam um novo estofado que favorece a acústica. Atualmente, o sétimo andar abriga um espaço multiuso. De original nele apenas as janelas internas e o piso das laterais, já que o ‘miolo’ não existia no projeto original: o prédio tinha o formato da letra U. Era deste andar que era vista a Serra do Curral, o que não é mais possível. Um andar abaixo, no sexto, ainda é possível ver o telhado original em concreto armado.

É importante destacar que os painéis pintados no corredor que dá acesso ao grande teatro são originais. Eles foram encontrados durante a restauração, acidentalmente, embaixo de cinco camadas de tinta. Não existia registros da pintura ser daquela forma. Outro detalhe é que as ripas de peroba rosa que estão neste mesmo corredor compunham o teto do Cine. Também merecem atenção a escada que dá acesso à plateia superior do Grande Teatro. Segundo especialistas é de estilo complexo, já que módulos não são soldados e, sim, encaixados. Atualmente, o Grande Teatro conta com 1 mil lugares, sendo 200 cadeiras originais.

FOTOS GENTILMENTE CEDIDAS PELO ACERVO DO CINE THEATRO BRASIL

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