A paisagem do olhar

Fotografias de Daniel Mansur transmitem sensações que vão além dos enquadramentos em uma viagem ao mesmo tempo universal e particular

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Dizem que o bom viajante não é quem dá a volta ao mundo colecionando em números os países visitados. O bom viajante é aquele que faz da curva da estrada um acontecimento, do entardecer uma pausa inesquecível e até mesmo da esquina de sua rua, por mais comum que possa parecer a outros olhos, um verso ou uma prosa primorosa. No caso do fotógrafo Daniel Mansur, ele consegue fazer até de uma inexpressiva parede branca do quarto uma paisagem, mesmo que de passagem.

O primeiro contato com uma câmera, dessas bacanonas, não foi na infância, nem na adolescência. Formado em Publicidade pela PUC de BH, esse encontro aconteceu durante a faculdade. E nem foi ele quem primeiro botou fé de que tinha algo especial nessa relação amigável desde o primeiro toque. Foi a professora Regina Motta o cupido dessa história. O cara levava jeito, tinha algo especial no olhar, ela logo percebeu.

Ainda na faculdade, Daniel arrumou um estágio em uma mineradora e foi informado que para assumir o posto era preciso saber fotografar. Disse que sabia e pronto, começaram os cliques com bons equipamentos e ele foi tomando tanto gosto pelo negócio que logo foi efetivado na empresa.

Isso foi em meados da década de 1980, com o Plano Cruzado de Sarney, que rezava que a inflação seria combatida com a nova moeda brasileira, o cruzado, que substituiu o cruzeiro. Época que o empreendedorismo virou febre por aqui. Só um parêntesis antes de continuar: o termo empreendedor (entrepeneur) é de origem francesa e significa “assumir riscos e começar algo novo”, embora no nosso país esse crescimento esteja mais ligado às nossas históricas mazelas socioeconômicas.

Voltando a história de Daniel Mansur, foi nesse período que ele resolveu pedir demissão para assumir riscos e começar algo novo:  abriu, junto com cineasta Cao Guimarães, a Versão Brasileira, empresa de vídeo e fotografia. O trabalho intenso nessa empreitada durou quatro anos e, depois disso, como o próprio Daniel conta, ‘uma coisa foi puxando a outra’: fotos publicitárias, fotos para arquitetos a partir de 1990, sem deixar de lado a fotografia autoral, de arte e editorial.

Seu trabalho é representado em São Paulo pela Galeria Chroma, no Rio pela Galeria Almacén, em Brasília pela Galeria Expoarte e, em Belo Horizonte, pelo Escritório de Arte Marcela Bartolomeo. Foi Marcela, inclusive, quem o ‘descobriu’, quando viu seu trabalho em um ambiente de uma mostra de arquitetura e design. Hoje, já são 33 reconhecidos anos de profissão

As fotografias de paisagens de Daniel Mansur merecem um capítulo à parte. Ele é o bom viajante do início deste texto, aquele que não precisa cruzar o mundo para mostrar a natureza de um jeito tão dele. Fotos que poderiam ter sido feitas em qualquer canto do planeta, mas que muitas vezes foram realizadas entre um trabalho e outro por um fotógrafo que enxerga muito além do que os nossos olhos costumam enquadrar numa estrada, num pedaço de mata ou entre as montanhas. Essa mágica vem de uma sensibilidade e apuro técnico que permite a Mansur manter sua autoralidade em meio a zilhares de fotos da natureza, muitas delas lindas, que inundam as redes sociais atualmente.

Recentemente, isolado como grande parte das pessoas ficaram durante a pandemia, ele começou a fazer experiências com a luz projetada nas paredes de sua casa e do seu estúdio, usando uma técnica que ele domina muito bem: o movimento intencional da câmera, mais conhecida por seu termo em inglês – ICM, que consiste no efeito óptico obtido por uma câmera fotográfica ajustada com a velocidade de obturação lenta, onde é possível captar efeitos de luz diáfanas, gerando imagens abstratas, criativas e artísticas.

O texto de Uoster Zielinski explica melhor esse trabalho: “Ao combinar fotografia e movimento Daniel consegue produzir imagens que, ao serem reveladas digitalmente, apresentam uma ampla gama de matizes. O resultado desse processo são imagens experimentais e poéticas, evidenciando o lado matérico  da fotografia, a saber: registro de luz, grão na imagem, textura e ambiente transluzente. O aspecto visual resultante dessa obra se afasta um pouco do que entendemos por fotografia, para se aproximar paradoxalmente do universo da pintura.

O conjunto dessa pesquisa imagética realizada por Daniel Mansur é um registro das poéticas possíveis em um ambiente de confinamento, com imagens que transmitem sensações como silêncio, roçar do vento ou cheiro desses lugares que existem apenas na obra do fotógrafo.”

Seja neste trabalho recente ou no que faz em todas as outras áreas de atuação, Daniel Mansur capta o que sua própria alma transborda: emoção. E, sim, com mais de 30 anos de estrada, várias exposições no currículo e nome reconhecido no mercado, ele continua atuando com o mesmo vigor e sensibilidade de quando começou.

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