Furacão de ideias

Mais do que isso, a designer Carol Gay se destaca pela consistência do trabalho que flui a partir da experimentação

Insta: Carol GayCarol Gay Estudio

O portfólio da designer Carol Gay é extenso, intenso e inspirado. Ela diz que muitas peças não teriam acontecido, não fosse sua insistência. A experimentação, a presença do feito a mão e a busca constante de novos materiais são características marcantes de seu trabalho. Acostumada a vasculhar as lojas do centro de São Paulo em busca de novidades que atraiam seu olhar experiente, ela também traduz em objetos o que a memória afetiva lhe oferece. Pode ser algo vivido na infância, quando já inventava novos usos para as coisas do universo caseiro ou de agora, com a experiência da maternidade. Mãe de gêmeos prestes a completar três anos, ela diz que os pequenos a ajudam a olhar para o novo com mais calma, embora não tenha perdido o desejo de transgredir a matéria de sua função original, propondo novos significados.

Formada em arquitetura, ela acreditava, até o último ano de faculdade, que seria esse seu caminho profissional. Enquanto o sonho não se concretizava, Carol buscava cursos que desenvolvessem seu lado criativo. “Eu queria mais e sempre corria ia atrás de conteúdos que me atraíssem”, diz. Já no final do curso, um amigo a chamou para fazer um workshop com os Irmãos Campana no MUBE. “Nos encontrávamos uma vez por semana e o curso era mais uma construção de repertório, de liberdade de criação e experimentação. Um ano depois, seu trabalho foi parar em Verona, na Itália. A peça, a luminária espelho Caracol, feita de base de pizza e mangueira iluminada, circulou pela mídia especializada e, a partir daí, a arquiteta começou a ceder espaço também para o design.

A experiência prática em sua formação veio na sequência, quando trabalhou por dois anos na na Tok & Stok. “Para mim, era o melhor lugar que eu enxergava poder aprender mais no Brasil. Foi muito bom, queria ver a fábrica, saber como eram os processos. Agrega fazer coisas que te dão conhecimento em outras áreas. Conhecimento nunca é demais”, avalia. O trabalho na importadora Urban também ensinou a Carol o outro lado da moeda, o dos negócios, enquanto ainda fazia alguns projetos de arquitetura e produzia peças.

Desde o início da carreira, a designer sempre participou de várias exposições, como a primeira na Itália e na 500 Anos Brasil Design, na Pinacoteca, ambas em 2000. Uma das primeiras peças que fez foi um revisteiro, feito de plástico PVC e aço com chapas de segunda mão, o que já apresentava uma das bases do trabalho de Carol, a sustentabilidade. “Gosto de levantar questões de reaproveitamento através das minhas criações”.

Às vezes, uma criação da designer demora para se revelar. Foi o que aconteceu com a chaise Cinto, por exemplo. “É comum eu ter materiais guardados. Fico olhando para eles até eles terem uso”, comenta ao explicar que, nesse caso, foi necessário um tempo, já que o que queria não era apenas uma cadeira feita de cintos, mas pensar no trançado, juntar as cores, se aproximar da cadeira de praia até que forma e função se fundissem.

Outras vezes, ela nem imagina que um trabalho vá repercutir e acontece dele virar uma sensação. Foi assim, por exemplo, com a mesa Cobre. Era uma encomenda para um hotel no Rio de Janeiro, a pedido de um amigo. Carol pensou na trama dos canos de cobre atrás de paredes, que cumpriam uma função, mas que ela queria dar outro uso. A foto, mostrada para Taíssa Buescu, diretora de conteúdo da Casa Vogue, saiu em página inteira na revista e depois conquistou Waldick Jatobá, da MADE, que a colocou no centro da exposição. “Mudamos um pouco a forma, o acabamento, dei uma sofisticada colocando a cor em evidência. Acabou virando uma edição limitada que elevou a mesa para outro patamar que, na época, eu nem imaginava.”

Seja nas edições limitadas ou no trabalho em série, o fato é que o trabalho de Carol Gay sempre tem identidade e cada peça é tratada como única. Nas séries, por exemplo, que ela tem feito utilizando vidro soprado, as peças são parecidas, mas nunca iguais.  Em tudo, o que a designer mais gosta é de experimentar, testar os limites, torcer, dobrar, ir fundo em cada criação. Além de explorar os materiais ao máximo, de fazer com as mãos, ela também não perde a oportunidade de ir ao fornecedor, conversar longamente, entender todos os processos.

Carol Gay desenvolve peças para empresas internacionais, móveis, luminárias e objetos para empresas nacionais, além de ter sua própria empresa, que nasceu a partir da mesa Cobre. Há algo de inquietante em tudo o que assina, como há foco e potência em seu trabalho que, como no começo desse texto, compõe um vasto portfólio, que destaca o design brasileiro não só aqui, mas em outros países.

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